sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

O submundo dos agrotóxicos

Luiz Cláudio Meirelles - Ex-gerente geral de toxicologia da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária)

Recentemente, um escândalo envolvendo irregularidades na liberação de agrotóxicos pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) foi parar nos jornais. O inseticida Diamante BR, da Ourofino Agronegócios, usado na lavoura de cana-de-açúcar, e o fungicida Locker, da FMC Química do Brasil, usado no plantio de soja, chegaram ao mercado sem passar pela avaliação obrigatória da agência reguladora antes de o produto ser registrado no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). Além desses, mais cinco produtos foram considerados irregulares. O caso é grave, já que a Anvisa é a responsável por impedir que produtos perigosos à saúde humana sejam comercializados e, consequentemente, cheguem à mesa dos brasileiros.
O Idec tem acompanhado esse caso com atenção, já que o uso de agrotóxicos faz parte de sua pauta de trabalho. Para tentar entender melhor essa história, a REVISTA DO IDEC entrevistou uma peça-chave: o ex-gerente geral de toxicologia, Luiz Cláudio Meirelles, que denunciou irregularidades do órgão. Pouco tempo depois, ele foi exonerado do cargo de confiança que ocupou por quase 13 anos.
Em 20 de dezembro, ele volta a integrar a equipe da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), que o cedeu à Anvisa em 1999. Até lá, está de férias no Rio de Janeiro (RJ), de onde respondeu, por telefone, as perguntas do Idec.

Idec: Você pode relatar o que aconteceu no caso de sua exoneração da Anvisa?
LUIZ CLÁUDIO MEIRELLES: Vou começar pelo final. A justificativa da Anvisa para a minha exoneração foi que eu não obedeci as regras para o encaminhamento das irregularidades que identifiquei e para o pedido de exoneração do gerente geral da Gavri (Gerência de Avaliação de Riscos), além do fato de o MPF (Ministério Público Federal) ter tomado conhecimento do caso antes de ele ter sido apurado. Eu discordei da justificativa, porque ela está muito aquém do que pode estar por trás disso tudo. Se eu perdi a confiança numa pessoa que é subordinada a mim, eu precisava tomar uma decisão. E, em relação ao MPF, eu não encaminhei nada a eles. Eu era um gestor técnico, detectei um problema, o documentei e encaminhei para os departamentos competentes, respeitando a hierarquia interna. Posteriormente, a Anvisa me acusou de já ter conhecimento de que o gerente da Gavri era um problema. Eu refutei essa afirmação, porque ele gozava da minha confiança, assim como do supervisor, dos outros gerentes e do diretor. E assim que eu descobri coisas erradas, pedi que fosse exonerado. Mas fui surpreendido com a minha exoneração. Irregularidades podem acontecer. O problema é usar o episódio para destruir o trabalho da gerência e desregulamentar o setor. A reação à minha exoneração não foi só minha, envolveu mais gente, porque há algum tempo a gente vem levantando questões nessa área de agrotóxicos que estão sendo muito difíceis de conduzir. A proibição do metamidofós, por exemplo, gerou uma série de reações. Foram parlamentares cobrando da Anvisa e tentando derrubar a RDC (Resolução da Diretoria Colegiada) que proibiu a substância. Vinha sendo assim sistematicamente. Nós respondíamos várias coisas para garantir aquilo que é o nosso papel: retirar os produtos mais tóxicos do mercado e não dar registro para os que são perigosos. Mas a pressão vinha sendo muito grande. Historicamente dentro da Anvisa, sempre fomos muito pressionados, o meu cargo sempre foi muito pedido por deputados. Teve um tempo em que a senadora Kátia Abreu [PSD-TO] foi para o Congresso falar mal da Anvisa. Nós entramos com representação contra ela, passamos por auditoria dentro da gerência. Mas continuamos tocando o trabalho como tem de ser. Implantamos um programa de resíduo que também foi muito combatido [PARA - Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos]. Não queriam que os dados fossem divulgados, pois isso causava problemas de produção. Então, ao longo dos anos, foi muita pressão. Acho que nos últimos dois anos houve um aumento de questionamento por parte da sociedade civil, levantamento junto à Câmara, filmes veiculados como O Veneno Está na Mesa, do Sílvio Tendler. Isso também está relacionado a uma reação. Outra fato é que se está fechando uma norma que pode apertar os critérios de avaliação e classificação toxicológica. Houve muita reação a essa norma, que é a revisão da Portaria 3. Se os critérios para definir se um produto causa câncer ou não for muito flexível ou mais rígido, isso poderá representar melhores ou piores resíduos na sua mesa. Resíduo melhor não tem, mas pode ter resíduos de produtos mais ou menos perigosos na sua dieta. Um ponto importante sobre a Anvisa precisa ser pensado: o cliente da Anvisa nunca foi a empresa, muito menos quem usa aquele produto na produção. É o consumidor quem tem de ser o cliente da instituição. Uma norma que fala de avaliação toxicológica de um produto é de interesse principalmente dos consumidores de alimentos porque essa norma interfere justamente nos critérios que definem se um produto é ou não carcinogênico (tem potencial cancerígeno). Se uma norma como essa é muito flexível, o nossa salada terá mais produtos que podem causar câncer, causar alterações embrionárias etc. Essa norma vinha sendo alvo de muita pressão. 

Idec: Mais alguém de fora, além do MPF, sabia das denúncias? 
LCM: Não sabia, mas na medida em que eu fui apurando os fatos, cancelei o ato administrativo que colocava aqueles produtos no mercado, e isso também gerou indagações. E para as empresas que pediram audiência, eu tive de informar que algumas irregularidades tinham sido encontradas e que elas estavam sendo encaminhadas para que a autoridade competente investigasse. A razão de ser da Anvisa em relação aos agrotóxicos é fazer a avaliação toxicológica. Se um produto é liberado sem essa avaliação, é preciso cancelar o ato administrativo e começar tudo de novo. Por isso eu cancelei todos os produtos irregulares e comuniquei o Mapa (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento). Isso gerou uma reação, principalmente de quem achava que estava tudo resolvido com o seu produto, só que não estava, porque o processo de liberação não tinha sido feito da maneira correta. 

Idec: Dá para se ter uma ideia de quando essas irregularidades começaram a ocorrer e de quantos produtos estão envolvidos? 
LCM: Eu identifiquei as primeiras irregularidades em meados de agosto, mas teve produto que foi liberado em dezembro do ano passado. A maior parte se concentrou no primeiro semestre deste ano. Foram sete produtos. Pode ser que uma auditoria mostre mais, mas não será uma busca fácil.
 
Idec: E você acha que vâo aparecer mais produtos? 
LCM: Pode ser que sim. Espero que a avaliação descubra se existem outros para que o registro possa ser cancelado até que eles sejam regularizados. Não é algo que se descubra facilmente porque, às vezes, a documentação do produto está toda bonitinha. É preciso ver quem fez a nota técnica e se ela foi feita corretamente. Felizmente, nesse primeiro momento, encontramos um número pequeno de empresas e produtos irregulares se compararmos com o número total.

Idec: E você já havia solicitado, no passado, investigação sobre outras liberações irregulares? 
LCM: Foi a primeira vez que eu detectei irregularidades em relação à avaliação toxicológica e a liberação de produtos formulados. Passamos por auditoria em 2008 e eu nunca desconfiei de que algo errado pudesse estar acontecendo. Esse é o tipo da coisa que você descobre de repente. 

Idec: Qual seria a “culpa” do Mapa? Dá pra dizer que ele é o epicentro desse esquema?
LCM: Não dá para falar isso, não. O que eu falo é que há uma questão política maior, a gente sabe quem são os grupos que pressionam. É o setor regulado junto principalmente com os ruralistas, os grandes produtores de commodities. Os pequenos e médios produtores estão organizados de outra maneira. Então não tem um epicentro. Estão falando sobre a criação de uma agência de regulação, a agência nacional de agroquímica. Isso também pode ser uma questão mais profunda. Durante o seminário que aconteceu no Congresso, a senadora Kátia Abreu disse que o modelo ideal para avaliar agrotóxico é o da CTNBio e que o modelo que temos hoje não serve. A gente sempre se posicionou contrariamente a isso.
Há uma compreensão de que isso não é da área da saúde, tanto que há projetos de lei tentando derrubar nossa competência. Eu entendo isso como um brutal retrocesso para o País. Defendo o contrário: tem que se avançar ainda mais com as áreas de saúde e meio ambiente na avaliação dos produtos, ainda mais num País que pelo 4º ano consecutivo é o maior usuário de agrotóxico do planeta. A gente tem de ter uma preocupação com a saúde da população. E além dos alimentos, isso cai no solo, cai na água, em todo canto. Se você for procurar monitoramento de resíduos, hoje só tem o de alimentos. Para um país que tá usando quase 1 milhão de toneladas de agrotóxico por ano, é uma questão importante. O consumidor tem de se apropriar e entender que o que é feito ali vai se refletir na sua vida. Pode não ser de imediato, mas reflete a longo prazo.
Por isso é tão necessário tirar do mercado moléculas velhas do mercado que têm implicação em problemas de saúde, não deixar entrar essas novas que tem esses efeitos crônicos conhecidos, ampliar a base de produtos para a agricultura orgânica e agroecológica. O setor de saúde tem de garantir isso, e para isso tem que ter sua competência garantida.

Idec: E o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais) liberou os agrotóxicos cujos IATs (Informes de Avaliação Toxicológica) foram forjados? O órgão não suspeitou ou constatou irregularidades?
LCM: Isso a investigação dirá. Não posso dizer se tem ou não irregularidade nesse órgão porque os estudos apresentados são diferentes, as motivações são diferentes, a avaliação que é feita em cada órgão é diferente. Às vezes, um produto é autorizado pelo Ibama, mas não pela Anvisa, e vice-versa. A avaliação deles é ambiental, enquanto a nossa visa à saúde humana.
 
Idec: Este tipo de irregularidade se deve apenas à pressão política e econômica ou é um esquema de corrupção? Ou as duas coisas? 
LCM: Eu prefiro deixar isso por conta da investigação. Acho que pode ter um pouco de cada coisa, mas não posso afirmar nada. Minha única preocupação é que nesse tipo de episódio, sempre existem pessoas interessadas em se dar bem. E tem os oportunistas, que tentam aproveitar o momento para desestabilizar o setor e dizer que as coisas não funcionam. E, diante do cenário que a gente vivia na Anvisa, de constante embate e discussão, isso aí é a sopa no mel, a oportunidade de dizer que está tudo errado. Mas o trabalho não está errado, ele é feito de forma competente. Só que eu sempre falei para os diretores que eu me ressentia de não termos uma área de investigação que nos desse suporte permanente (que investigasse como as coisas acontecem, como gestores e servidores conduzem seu trabalho), porque lidamos com mercados gigantescos, com interesses econômicos muito fortes. Isso nos deixa muito fragilizados. As coisas podem estar acontecendo e você nem percebe. E quando irregularidades são descobertas, você também não recebe apoio. É como se fôssemos criadores de caso. E não é isso. Eu não sei o tamanho da coisa com que eu estou lidando, eu sei lá se é uma coisa estruturada, uma máfia. 

Idec: Quais órgãos, empresas e pessoas, a seu ver, estão envolvidos nesse esquema? 
LCM: Até o momento em que eu saí, havíamos identificado quatro empresas. Mas a Anvisa disse que vai fazer uma auditoria, e espero que faça mesmo.
Sobre os órgãos não posso afirmar nada, mas um jornalista da Folha de S. Paulo levantou algumas falhas do Ministério da Agricultura.
E em relação à equipe técnica da Anvisa, ela não me parece ter nenhum envolvimento com o problema. Mas pode ser que depois da apuração policial sejam detectadas outras irregularidades.

Idec: Quais as principais ameaças que pairam sobre o papel da Anvisa na avaliação e reavaliação de agrotóxicos?
LCM: Há projetos de lei que tentam tirar nossa competência. É uma pressão que vem principalmente dos produtores de agrotóxicos e de quem usa esses produtos. Essas pessoas veem a atuação da área de saúde como um problema, alegam que é lenta, que faltam produtos no mercado. O que não são argumentos verdadeiros, porque desde que eu entrei na Anvisa, em 1999, a produção agrícola no Brasil nunca parou e nunca faltou produto, apesar das proibições.
Outra ameaça são as regras que vão estabelecer os critérios para a avaliação dos produtos. A preocupação é que se a regra for malfeita, flexível, irão aumentar os registros de produtos perigosos. Na Anvisa, trabalhamos com a avaliação de perigo, que significa que quando o produto é testado em animais e se mostra carcinogênico, não pode ser autorizado. Não vou ficar calculando se em humanos vai ter um caso por cem mil ou por um milhão, simplesmente não autorizo. O nosso critério é de restrição, ou seja, se o produto tem efeitos crônicos conhecidos e a lei nos respalda, não tem discussão, ele não é autorizado.
É preciso ter critérios muito claros para avaliar produtos, senão passa tudo. Se a gente tem uma agência reguladora, ela tem que regular. Se não, é melhor desregulamentar, como muitos acham que é possível. Eu não acredito numa sociedade que se autorregulamenta, mas bem que eu gostaria que todos soubessem das suas responsabilidades e que os fabricantes só colocassem no mercado produtos que não fazem mal nenhum, mas as regras de mercado desrespeitam tudo. Se o cara descobriu uma coisa que acha que funciona e está a fim de vender, o restante pouco importa. O regulador entra para colocar ordem nisso.
A gente já proibiu alguns agrotóxicos durante a minha gestão, tiramos uma serie de produtos do mercado. Tudo conseguido com muita resistência, muitas brigas judiciais. Felizmente o Judiciáro tem dado sentenças exemplares sobre a nossa competência, e conseguimos não perder as decisões. Isso tem de ser mantido, a reavaliação é um ponto importante. Tem um bocado de moléculas que já deveriam estar proibidas. Mas para fazer isso, é um trabalho muito pesado e penoso.
A equipe da Anvisa é muito qualificada em toxicologia, todos com mestrado. Mas precisa de um apoio político maior e ser respaldada por alguns setores da sociedade para que possa fazer o trabalho com tranquilidade e reduzir as pressões do outro lado.
Uma terceira ameaça é a criação de uma agência de regulação, a Agência Nacional de Agroquímica. Se essa agência seguir o modelo da CTNBio, como alguns querem, será bastante problemático, tendo em vista o grau de insatisfação com a tomada de decisões em relação aos transgênicos. O modelo que temos hoje é complicado, burocraticamente falando, mas funciona.
Outra coisa que não chamo de ameaça, mas de desafio, é fortalecer os produtos destinados à agroecologia. Já existe um esforço para encontrar mecanismos mais ágeis de avaliação e disponibilização desses produtos para substituir os agrotóxicos mais tóxicos. Porém, embora haja muito espaço e muita tecnologia [para agroecologia], falta investimento. Muitas vezes você tem uma verba grande destinada ao agronegócio, e não tem uma verba destinada a mecanismos de controle que podem diminuir tremendamente o uso de agrotóxicos.
O que se busca é isso, entender que esse é um tema central nesse debate; não é uma coisa periférica. Fortalecer essas novas tecnologias. Para isso as instituições têm que apostar, acreditar, investir, se não esse tipo de coisa não acontece. É um baita desafio, mas é o futuro.

Idec: Os últimos relatórios do Para (Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos) mostram que em cerca de 30% das culturas examinadas são utilizados agrotóxicos proibidos ou em excesso. O que o consumidor pode fazer?
LCM: É preciso lembrar que os clientes da Anvisa não são as empresas, muito menos quem usa agrotóxicos na lavoura. É o consumidor. A população tem que entender que uma decisão mal tomada pela agência pode aumentar o número de doenças e até de mortes. É importante o consumidor cobrar a agência reguladora para que ela de fato trabalhe em normas e leis que reduzam a contaminação dos alimentos. Se deixarmos moléculas velhas e tóxicas serem comercializadas por pressões do mercado e políticas, isso vai se refletir diretamente na nossa mesa. Apesar de ninguém morrer de imediato, isso pode se refletir na saúde ao longo dos anos.
Os consumidores e o Idec, como seu representante, tem de acompanhar essa causa e se fazer presente, pedindo para a Anvisa tirar as moléculas problemáticas de circulação, ter critérios rígidos para que produtos que causem câncer não sejam aprovados etc. Isso tem que ficar claro para a população, se não a discussão fica só entre aqueles que têm interesse no mercado desses produtos.
Este ano se iniciou a análise fiscal para produtos in natura, os quais tínhamos dificuldade de rastrear. Durante dez anos só fazíamos análise de orientação. Agora a ideia é responsabilizar mais o varejista e o produtor em relação a isso.
No PARA 2012 nós trabalhamos com uma cultura só [na análise fiscal]. Para o ano que vem não vi o resultado das discussões por causa da minha demissão. Mas havia propostas para outras áreas, como produtos veterinários, leite, de se unificar esses programas, dar uma resposta maior à sociedade e usar a experiência do PARA a fim de que outros também avancem. Acho que o consumidor, e o Idec como representante, tem de estar junto, chamar outras entidades para atuar junto para que a gente produza os melhores resultados e diminua o grau de contaminação.

Idec: E por que o Para 2011 ainda não foi publicado?
LCM: Ele deveria ter sido publicado no final de novembro, mas aí aconteceu esse problema todo [da demissão]. Agora eu estou do lado de cá, junto com os consumidores, cobrando. Essa situação tumultuou muito a equipe, mas espero que ele saia este ano ainda.

Idec: No Mato Grosso, principal estado produtor de grãos do País e campeão nacional de uso de agrotóxicos, e em vários outros estados, há inúmeras denúncias de que agrotóxicos já proibidos [metamidofós, por exemplo] continuam a ser usados. Em teste recente detectamos em pepinos em conserva resíduos de um que também não é autorizado [parationa etílica]. Qual é a situação da fiscalização? Há descontrole total? De quem é a responsabilidade dessa fiscalização?
LCM: A responsabilidade de fiscalização no campo é do Ministério da Agricultura e das secretarias de agricultura. A Vigilância Sanitária também participa, mas a gente entra no ponto exato de verificar a qualidade do alimento em relação à quantidade de agrotóxicos, que é o que o PARA faz, imediatamente antes do consumo. Essa informação é repassada aos órgãos de agricultura, que junto com a Vigilância Estadual pode retornar na cadeia produtiva e corrigir o problema. A situação está distribuída dessa maneira. A ideia é essa: o PARA produz a informação, retorna pros vários entes no seu nível local, e eles tentam mudar o que está causando contaminação.
O PARA foi criado porque avaliar agrotóxico é caro e complexo e a gente precisava agir de maneira unificada, com uma coordenação nacional concomitante com os estados. Agora com a análise fiscal talvez seja mais direto, porque será tratado com o fornecedor e distribuidor de alimentos. Ele tem de comprar de origem conhecida e com qualidade. Muda um pouco o escopo da atuação. A gente tem atuado até com o Ministério Público eventualmente, em alguns estados chegam a ser necessários termos de ajustamento de conduta para que os órgãos cumpram com seu papel em relação à fiscalização dos agrotóxicos. A ideia foi trabalhar conjuntamente para dar apoio àqueles estados em que sabemos que as pressões poderão ser maiores.
A gente espera que a rede varejista assuma isso de fato, entendendo que contaminação por agrotóxico é um problema de saúde pública.
Publicado originalmente na Revista do Idec nº 172 - Dezembro de 2012

quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Consumo de Leite Bovino: Informe-se!

Galactolatria: mau deleite

O leite e seus derivados são alimentos pretensamente conhecidos por boa parte dos humanos, especialmente no ocidente. Quase todos que os consomem os idolatram. A alvura do leite evoca pureza, limpeza, saúde, desejáveis em qualquer alimento. Mas essa ilusão de pureza e saúde desaparece assim que o universo galactômano e galactocrata é descortinado, uma ação levada a efeito pela autora, Sônia T. Felipe, ao longo de dez anos de pesquisa, entre 2002 e 2012. Galactolatria: mau deleite era o livro que faltava, no Brasil, para ajudar as pessoas a conhecerem melhor o leite que ingerem e a realidade da vida das vacas das quais ele é extraído.
Nenhum governante ou médico é diretamente responsável pelas doenças que afligem as pessoas por conta do que elas colocam em seu prato. Decisões dietéticas são de foro íntimo.
Entretanto, se o comedor ignora a real natureza dos alimentos que ingere, suas escolhas não são sábias, são cegas. Dessas, não pode resultar boa saúde.
Galactolatria: mau deleite é um livro de filosofia crítica, dedicado a transmitir ao consumidor dados e informações sobre o sistema de extração do leite. Aqui, a leitora e o leitor encontram informações de fontes médicas e especializadas contrárias ao consumo de leite bovino por seres humanos. Este livro revoluciona a concepção de responsabilidade pela própria saúde, a dos animais e a ambiental.
Uma leitura para todas as famílias: de veganos, vegetarianos, ambientalistas, intolerantes à lactose, alérgicos às proteínas do leite, professores, nutricionistas, médicos, fisioterapeutas e todos os profissionais que orientam aqueles que precisam redirecionar seus hábitos alimentares.

Passaporte para o Mundo dos Leites Veganos

O Passaporte para o Mundo dos Leites Veganos é uma ferramenta da Oficina de Leites Veganos, oferecida no Bistrô Babele (Florianópolis, 2010), no Pouso do Tapeceiro (Praia da Gamboa, Garopaba 2010), no Restaurante Vegethus (Consolação, São Paulo 2010) e na Casa do Rio (Barra da Lagoa, Florianópolis 2011).
Os adeptos do leite vegano artesanal aboliram o uso do leite animal e obtêm os mesmos nutrientes (cálcio, açúcar, gordura, proteínas e vitaminas) de fontes puramente vegetais: sementes, oleaginosas e cereais, das quais extraem o leite, não mais da vaca.
A Oficina de Leites Veganos e este Passaporte para o Mundo dos Leites Veganos – receitas, criados para abolir a exploração animal, contribuem para a recuperação da saúde humana, prejudicada pela ingestão da lactose, da caseína, do excesso de cálcio, dos hormônios, dos antibióticos e dos contaminantes presentes no leite animal.
A composição do leite bovino é maravilhosa, mas somente para os bezerros, justamente os únicos impedidos de mamarem o leite de suas mães.
Somos humanos, não bovinos. O leite de vaca, com grande quantidade de cálcio e hormônios de crescimento, permite que o bezerro dobre de tamanho em poucos meses. Mas é deficiente em magnésio, pobre em ferro, e não contém ômega-3, ácido graxo essencial para a nutrição do cérebro humano.
Cada leite vegano tem sua própria configuração nutricional. Experimente-os. Adote-os em sua dieta. Eles fornecem os nutrientes que você precisa: cálcio, ferro, magnésio, proteínas, zinco, selênio e ômega-3, conforme descrito na apresentação de cada uma das matérias das quais se pode extrair leite.

Serviço:

Galactolatria: mau deleite 
Sônia T. Felipe (2012).
São José: Ecoânima, 304 p.
R$ 45,00 + frete

Passaporte para o Mundo dos Leites Veganos
Sônia T. Felipe (2012).
São José: Ecoânima, 32 p.
R$ 10,00

Para adquirir os livros, escreva para galactolatria@gmail.com
 

domingo, 23 de dezembro de 2012

O Veneno Está na Mesa

Este documentário, dirigido pelo premiado cineasta brasileiro Silvio Tendler, alerta sobre o uso indiscriminado de agrotóxicos na agricultura brasileira, que atualmente é a recordista mundial no uso desses agentes químicos fornecidos por empresas como BASF, Bayer, Dupont, Monsanto, entre outras. Muitos dos venenos produzidos por estas empresas foram banidos em vários países de todos os continentes, mas no Brasil continuam em uso, inclusive pelos pequenos agricultores, que são obrigados a usar sementes transgênicas e pesticidas para conseguir crédito junto aos bancos.

O filme de apenas 50 minutos faz parte da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida. Ele nos dá uma noção bem abrangente da gravidade do assunto, apontando os riscos ambientais e de saúde pública, além dos históricos interesses econômicos da iniciativa pública e privada neste setor. Confira:


sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

Entrevista com Susana Prizendt, coordenadora da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos no estado de São Paulo


Vivemos em um sistema que condena um enorme número de pessoas à falta de comida, à desnutrição, à fome e à morte”
 
Causa Operária entrevista Susana Prizendt, coordenadora da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos no estado de São Paulo, iniciativa da qual participam vários movimentos sociais

Causa Operária: Qual é o objetivo da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos?

Susana Prizendt: Em nome da Campanha, gostaria de agradecer a oportunidade oferecida pelo jornal Causa Operária, já que é muito difícil conseguirmos espaço na grande mídia e todo espaço aberto é importante para fomentar o debate com a sociedade. A Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e pela Vida é uma iniciativa da qual fazem parte vários movimentos de diferentes áreas, porque o assunto é um tanto complexo. Nós temos entre nós pessoas ligadas aos direitos humanos, porque é um direito básico à alimentação segura da população que está em jogo; dos movimentos campesinos, que reivindicam melhores condições de trabalho no campo e um sistema de distribuição de terra mais justo; da área da saúde e da ciência, que podem fundamentar cientificamente o quanto os agrotóxicos fazem mal a saúde; e também pessoas ligadas aos movimentos ambientalistas porque o meio ambiente realmente está sendo extremamente exposto a danos. Queremos alertar a sociedade sobre a situação calamitosa no campo com o uso completamente abusivo dos agrotóxicos no cultivo. 

Causa Operária: O Brasil se tornou tricampeão mundial em uso de agrotóxicos e vice-campeão mundial em plantio de transgênicos. Como isso aconteceu?

Susana Prizendt: Desde a crise [capitalista] de 2008, aconteceu um duplo movimento no mundo. Na maioria dos países desenvolvidos houve uma movimentação e cobrança maiores dos movimentos sociais que exigiram dos governos o endurecimento das leis contra os agrotóxicos e o uso de transgênicos. Vários países já têm leis que proíbem certos princípios ativos e fortes reivindicações para uma regulação mais rigorosa dos transgênicos.
No Brasil, as políticas públicas favorecem os agrotóxicos, que chegam a usufruir de isenção fiscal para comercialização. O governo exige que os agricultores apresentem nota fiscal de agrotóxicos, adubos químicos e sementes para liberar o financiamento público, estabelecendo, assim, a obrigação de comprar o pacote básico de produção imposto pelas multinacionais.
A bancada ruralista do Congresso, representante dos latifundiários, o setor mais retrógrado da sociedade, e das multinacionais, representa essa política e torna o governo refém dos seus interesses.
A partir de 2008 houve um grande deslocamento de capitais dos países desenvolvidos, onde a economia tinha entrado em colapso, para os mercados especulativos de commodities. A produção de matérias primas nos países emergentes e atrasados ficou muito interessante para a obtenção de altos lucros pelas multinacionais do setor do agronegócio. O Brasil tornou-se um lugar ideal para escoar a produção de venenos e sementes transgênicas.

Causa Operária: Alguns princípios ativos que são utilizados no Brasil já foram banidos em vários outros países. Por que isso está acontecendo?

Susana Prizendt: Muitos desses princípios foram banidos em outros países devido à organização mais sólida dos movimentos sociais e dos próprios consumidores. Aconteceu nos últimos tempos um enrijecimento das leis e das concessões, devido à comprovação dos seus malefícios e esses princípios acabaram sendo proibidos em países dos mais diversos tipos, desde a França até o Paraguai.
No Brasil não haviam acontecido ainda amplas mobilizações da sociedade contra as atividades depredadoras do agronegócio. Por isso a urgência da criação da Campanha. O Brasil está começando a acordar, embora muito tarde, para a gravidade da situação. Uma das principais bandeiras, como reinvindicação mínima em torno da qual esperamos agrupar os movimentos sociais, é que estes princípios ativos sejam proibidos no Brasil. Estamos promovendo um abaixo-assinado com o objetivo de pressionar o governo.

Causa Operária: Como funcionam as politicas públicas de incentivo ao uso dos agrotóxicos e transgênicos no Brasil?

Susana Prizendt: Temos um sistema que é muito cruel, pois as empresas, geralmente ligadas aos grandes grupos multinacionais, ficam apenas com a parte do favorecimento, como a isenção fiscal, ajuda para instalar sua rede de distribuição de venenos e outras facilidades para favorecer o domínio pleno do mercado brasileiro. Mas elas não respondem pelos problemas que geram, como os inúmeros problemas de saúde pública, que são cobertos com dinheiro público, sem contar os gravíssimos problemas ambientais, que praticamente são ignorados.
A lógica foi totalmente invertida. Estamos o tempo todo correndo atrás de reparações dos danos causados em vez de correr atrás de impedir que esses danos sejam gerados para a população e o meio ambiente.

Causa Operária: Como as multinacionais influenciam as politicas de incentivo de agrotóxicos e transgênicos?

Susana Prizendt: As multinacionais no Brasil têm uma associação muito forte com os grandes produtores brasileiros desde o final da década de 1990. O sistema político brasileiro está atrelado às multinacionais. Aqui, nós não temos um sistema público de financiamento das campanhas eleitorais; existe um sistema de financiamento privado que permite doações das grandes empresas. Para se eleger um deputado ou qualquer outro profissional para um cargo político, os partidos recorrem aos poderes econômicos com base nas multinacionais, o que torna a troca de favores algo natural. Isso acontece tanto no legislativo como no executivo. Temos a submissão destes políticos aos interesses das multinacionais e a legislação acaba sendo conivente com esses interesses.

Causa Operária: Quais foram as mudanças nas políticas implementadas pelos governos do PT em comparação com os governos do PSDB?

Susana Prizendt: A primeira coisa que acho importante reforçar é que os governos não são só do PSDB ou só do PT, eles são governos de coalisão. Tanto o PSDB, quando se aliou ao DEM, como o PT, que se aliou ao PL ou PMDB, ficaram sujeitos a setores super-reacionários, como por exemplo, os que representam o agronegócio. Incluindo aí os antigos coronéis que querem manter privilégios exorbitantes. Os representantes mais de esquerda, dos movimentos sociais, que reivindicam melhores condições tanto para os camponeses como para a população em geral, têm perdido muita força no governo devido a essas coalisões. Por isso é importante que a sociedade sempre se mobilize e cobre do governo as suas reinvindicações contra os interesses dos ruralistas e das multinacionais. Neste sentido, a atuação de movimentos como o MST, por exemplo, é importante para lutar por uma reforma agrária decente, como já foi feita em grande parte dos países desenvolvidos.

Causa Operária: Como os agrotóxicos estão afetando a nossa saúde e o meio ambiente?

Susana Prizendt: É uma vastidão de problemas que os agrotóxicos causam tanto na saúde do ser humano diretamente como no meio ambiente em geral.
Na saúde humana, entre os que já foram pesquisados, os mais conhecidos são os efeitos neurológicos que afetam a parte psíquica do ser humano, intensificando a ocorrência de transtornos variados que se têm agravados nos últimos anos. Também na parte endócrina, porque certas substancias mimetizam as substâncias dos hormônios. Elas acabam desregulando completamente o sistema hormonal, gerando problemas sérios. Mas o grande problema de saúde pública tem sido o aumento do câncer, que nos últimos anos tem se deslocado de alguns órgãos em que antes eram mais comuns, como por exemplo, o pulmão, para a parte digestiva como pâncreas, intestinos, tireoide, entre outros. O que está diretamente ligado à alimentação com volumes absurdos agrotóxicos.
No meio ambiente todas essas substâncias tóxicas não somem. Por exemplo, quando são usados aqueles aviões agrícolas para pulverizar lavouras, não se tem o menor controle de onde vão parar esses venenos. Eles são carregados pelo vento e pela água da chuva, penetrando no solo e atingindo o lençol freático, ou seja, se espalham por todo o planeta. Existe relato de venenos até nas geleiras. Então a partir do momento que essas substâncias entram no meio ambiente, o ser humano não tem mais controle sobre elas, sendo também ingeridas pelos animais selvagens.
No Brasil temos visto o uso crescente de veneno ao ponto de se chegar a um consumo de cerca de 1 bilhão de litros em um ano. É algo assustador. Se formos dividir isso por habitante, dá uma média de 5,2 litros de veneno para cada. Não que cada pessoa consuma diretamente isso, mas acaba entrando no meio ambiente e em nosso organismo.

Causa Operária: As pesquisas científicas sobre os agrotóxicos e transgênicos são confiáveis?

Susana Prizendt: Existem dois tipos de pesquisas. A maior parte delas é financiada ou autorizada pelas multinacionais, porque envolve a necessidade de usar os produtos registrados por estas empresas. Muitas vezes estão envolvidas leis sobre sigilo e royalties e é necessária uma autorização formal delas, que tentam autorizar apenas as pesquisas que possam controlar e manipular.
As pesquisas independentes são muito boicotadas e raras. É muito mais difícil divulgar os resultados e fazer com que sejam aceitas, pois as multinacionais montam campanhas enormes contra. Normalmente não há recursos destinados para estas pesquisas.
O patrocínio das multinacionais busca resultados favoráveis, pois está obviamente vinculado à venda dos produtos que oferecem.

Causa Operária: No Brasil, há pesquisas independentes das multinacionais?

Susana Prizendt: Por serem pesquisas caras e longas, que exigem equipamentos sofisticados, laboratórios, equipes de trabalho qualificadas etc., ocorrem em número insuficiente no Brasil e não dão conta do volume de testes e estudos que realmente deveriam ser feitos, pois os efeitos são muito variados e há muitos princípios ativos envolvidos. Inclusive, não há estudos que mostrem a relação entre os princípios ativos entre si. Não se sabe o que a interação entre eles pode causar. Além de o setor ser pequeno e com poucos recursos, as multinacionais tentam inviabilizá-lo, principalmente por meio de ataques jurídicos, engessando e processando quem tenta fazer algum tipo de pesquisa independente, ou tentando intimidar os cientistas.

Causa Operária: Existe um mito de que para alimentar a população mundial é necessário produzir com veneno. Ouvimos a senadora ruralista Katia Abreu defender que “pobre tem que comer comida envenenada”. É possível produzir alimentos suficientes sem o uso de agrotóxicos e transgênicos?

Susana Prizendt: A Campanha sempre está mostrando para as pessoas que na verdade acontece o inverso. Se insistirmos nesse sistema produtivo baseado na monocultura, no uso crescente de venenos e transgênicos, na concentração de terra, nós não vamos conseguir alimentar mesmo a humanidade, como, de fato, hoje já não se consegue.
O modelo monocultor enfraquece a terra, gera super pragas resistentes nunca vistas antes. É um sistema que simplesmente produz commodities que são negociadas nos mercados futuros para especulação. Não é um sistema que está preocupado em produzir comida.
Atualmente, a comida está sendo produzida pela agricultura familiar, em condições precárias e quase sem apoio do poder público. Somente será possível alimentar tanto a população atual como a futura se os investimentos forem direcionados para produção de alimentos nutritivos e não para alimentar os lucros de um punhado de especuladores.
Escutamos os representantes do agronegócio falando em produtividade, mas ela se resume nas toneladas de soja, de cana de açúcar e de milho. Isso vai perpetuando um sistema que não é sustentável porque mesmo que se diga que a soja é usada para alimentar animais que serão futuramente comida para os seres humanos, a quantidade de terra necessária para produzir soja para alimentar esse gado poderia estar produzindo muito mais comida para muito mais pessoas, sem provocar tantas doenças nem depredar o meio ambiente, como ocorre nas monoculturas repletas de veneno.
Segundo a ONU [Organização das Nações Unidas], mais de um bilhão de pessoas passam fome no mundo. O que demonstra que a distribuição de alimentos é desigual. Em relação à distribuição de carne, se olharmos o mapa do mundo, não são todos os países que a consomem em quantidade. Apenas uma minoria consome carne habitualmente.
Considerando o transporte, quando pensamos num sistema que é montando para produzir etanol através do milho ou da cana, esse sistema está usando terras que poderiam estar sendo usadas para a produção de alimentos. E quem está usando esse etanol? Bilhões de pessoas no mundo ainda não têm o seu próprio carro e nem irão tê-lo porque o planeta não suportaria o impacto. Quer dizer que vivemos num sistema elitista, que mantém privilégios para uma minoria e que condena, cada vez mais, um enorme número de pessoas à falta de comida, à desnutrição, à fome e à morte. É um sistema assassino. Além de tudo isso, não fazemos a menor ideia do que ele irá acarretar de problemas ambientais, com as mudanças climáticas e com a diminuição da biodiversidade através dos transgênicos e dos venenos promovidos pela monocultura.
O desiquilíbrio ambiental já está sendo violento e não sabemos nem mesmo se será possível produzir as próprias espécies transgênicas, como vimos recentemente na quebra da safra do milho e da soja transgênicos nos EUA que não resistiram à pior seca dos últimos 50 anos.

Causa Operária: Quais seriam as alternativas às políticas que incentivam o modelo de monocultura devastador?

Susana Prizendt: Seria necessário que houvesse uma inversão. Hoje em dia a mão de obra não é formada para atuar fora do modelo devastador. Não temos agrônomos preparados para trabalhar com a terra. Eles não sabem produzir de maneira orgânica. Se você simplesmente tirar os agrotóxicos do processo, isso não basta para a realização do equilíbrio necessário para uma produção orgânica. A produção orgânica é aquela que realmente entende a terra, que sabe quando a terra está equilibrada, que sabe intercalar as culturas, que trabalha com o ecossistema, com o clima local.
Seria necessário que as políticas públicas estivessem direcionadas a investir na formação técnica independente dos interesses das multinacionais e dos latifundiários. Os camponeses precisam de assessoria técnica, equipamentos, boas terras e financiamento. A agroecologia quase não tem financiamento. No Brasil, o governo investe bilhões na agricultura depredadora de exportação que transforma o País num mero produtor de umas poucas matérias primas. Em resumo, o governo investe em uma agricultura que não busca produzir alimentos para o povo brasileiro e sim para o mercado especulativo, e esse dinheiro vai parar na mão de uma minoria que seria a elite da elite. Ou seja eles ficam com o lucro e socializam o prejuízo com a população. Nós buscamos mobilizar a sociedade para se opor a essas políticas.

Causa Operária: Você gostaria de acrescentar algo mais?

Susana Prizendt: Eu gostaria de convidar as pessoas para terem um envolvimento maior com a Campanha. Temos comitês distribuídos no País inteiro. É uma campanha nacional, composta por movimentos como o MST, FioCruz, Via Campesina e Abrasco. A questão é urgente, não dá para adiar mais. As consequências já são terríveis e vão ser cada vez piores. Principalmente porque a tendência é o aumento da concentração de capitais nos países emergentes devido ao aumento da crise nos países mais ricos. Convidamos as pessoas a conhecerem nosso site, toxicos.org. Ele conta com muitas informações sobre o assunto. Sempre estamos preparando materiais informativos para esclarecer a população sobre o tema. Coisa que a grande mídia não faz e que é vital para garantir o direito à alimentação segura e ao ambiente preservado.

Publicado no site EcoDebate, em 10/12/2012, com a colaboração de Enio Jose Silva

Para saber mais, clique na imagem abaixo:





quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Impunidade

Nilcilene Miguel de Lima

Nilcilene Miguel de Lima, agricultora de uma comunidade de pequenos produtores e extrativistas em Lábrea, cidade no Amazonas, é apenas um exemplo entre todos os ativistas e defensores da floresta que sofrem constantes ameaças de morte advindas de madereiros e grileiros na Amazônia. A impunidade é tamanha que, em maio de 2012, após Nilcilene ter que fugir de sua comunidade (por causa da interrupção de sua escolta prevista pelo programa Proteção aos Defensores de Direitos Humanos da Secretaria de Direitos Humanos - SeDH), os madereiros ilegais fizeram um churrasco em comemoração à saída dela do local.
Até quando veremos pessoas serem mortas por defender um patrimônio que é de todos nós? Até quando veremos "Chicos Mendes", "Dorothys Stangs", "Josés Claudios Ribeiros" e "Marias dos Espíritos Santos" perderem suas vidas por defenderem a NOSSA qualidade de vida?
Você pode até pensar que não tem nada a ver com isso, mas quando essa gente defende a floresta em pé, está nos defendendo também. Está defendendo o regime de chuvas que irrigam nosso alimento; está defendendo um planeta habitável para nossos filhos e netos; está defendendo a continuidade da vida na Terra.
Paremos para pensar nisso e elevemos as mãos às consciências! Todos nós deveríamos estar lutando pelos mesmos objetivos destas pessoas ou, ao menos, clamando por justiça!

Para saber mais:





 



sábado, 15 de dezembro de 2012

Diga NÃO às hidrelétricas na Amazônia!

Rio Tapajós - Santarém - PA / Foto: Cintia Guido

Não podemos deixar que se escreva mais um triste capítulo na história do Brasil com a construção das hidrelétricas na Amazônia. Este dito "desenvolvimento" não respeita o modo de vida das populações locais, as quais necessitam do meio ambiente sadio para a sua subsistência, além de não considerar a história e as dinâmicas socioambiental e ecológica da região. Precisamos nos manifestar com urgência! A nossa indiferença se transforma em concordância! Diga NÃO às hidrelétricas na Amazônia!




Manifestação em Altamira exige julgamento de ações contra Belo Monte


Manifestação em Altamira

Cerca de 150 pessoas protestaram no dia 10/12/2012 em Altamira, na frente da sede da Justiça Federal. Os manifestantes instalaram uma árvore de natal com galhos secos e pacotes simbolizando os 56 processos contra Belo Monte e em defesa dos direitos das populações do Xingu que aguardam julgamento.

O protesto, organizado pelo Movimento Xingu Vivo Para Sempre, faz parte da Campanha Belo Monte Justiça Já! e ocorre no dia do aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos.

“Aqui em Altamira está um caos, os moradores estão sendo expulsos sem respostas, estão sendo arrebentados e chutados de seus lares, onde construíram vidas… são almas! Eles são expulsos de uma forma macabra”, bradou o Dom Erwin, o bispo da Prelazia do Xingu, que participou do protesto.

Obrigado a sair da comunidade do Santo Antônio, onde viveu por mais de 30 anos, para dar lugar ao canteiro de obras de Belo Monte, Élio Alves Silva estava indignado: “Eu bati na porta da justiça federal e ninguém me atendeu. Eu sou um pescador…eu era um pescador. Eu vivi a minha vida como pescador…e hoje não tenho mais direito nem de pisar onde eu pescava. Eu  estou sem opção, profissão, eu estou sem emprego, e antes eu vivia da terra e da pescaria… A Norte Energia me arrancou de lá, sem direito a eu recorrer a nada… me arrancaram de lá e eu tive que baixar a cabeça, e sair calado… Tive que deixar tudo pra trás, aquilo que eu vivi, aquilo que eu construí. Estamos num país onde não tem justiça… Uma vida que eles tiraram para destruir”, disse.

Antonia Melo, coordenadora do Movimento Xingu Vivo Para Sempre, destacou que “as famílias da cidade estão assustadas e desesperadas. O projeto da Norte Energia para reassentamento das famílias foi modificado de novo e agora eles dizem que só vão construir casas de 60 metros quadrados, desconsiderando o que tinha prometido. Até agora nenhum reassentamento foi realizado, e comunidades tradicionais como a de Santo Antonio e comunidades ribeirinhas são expulsas mediante indenizações irrisórias, quando pagam, e sem respeito à suas culturas e raízes. A população nunca foi consultada e tem tido seus direitos violados sucessivamente” e que “enquanto os 56 processos que expõem as ilegalidades e violações de direitos humanos de Belo Monte ficam engavetados no judiciário, os processos da Norte Energia e do governo federal são rapidamente julgados em favor da empresa e contra os direitos da população”.

Cecílio Kayapó, pescador indígena que participou de um mês de protestos no sítio pimental, chorou ao falar que a Norte Energia e Ibama não reconheceram os impactos sofridos pelos pescadores, que vem denunciando a diminuição dos peixes na região da Volta Grande do Xingu. “Estamos sendo enrolados enquanto perdemos nossa condição de sobrevivência”, indigna-se.

Sindicalistas ligados à luta pelos direitos dos trabalhadores da construção civil criticaram Belo Monte e a prisão de 5 suspeitos de ter incendiado um alojamento no canteiro de obras:

“Índio, fauna, flora, ribeirinhos, tudo isso está sendo massacrado e com isso vem a questão das injustiças… quem são os presos agora? quem está preso? os operários… são aqueles que constroem, aqueles que começam do chão e constroem as grandes obras pra eles… eles são massacrados… é uma injustiça. Nós estamos vivendo no período da ditadura onde Altamira está militarizada. Tem polícia militar, tem exército, e isso além das forças privadas... Esses cinco trabalhadores são presos políticos. Estão presos sem prova. Liberdade para os operários!!!

A estudante Karoline Militão Mendes, 15, descreveu a manifestação nestas palavras: “Foi um dia muito representativo, chegamos e começamos a falar a verdade, começamos a manifestação com poucas pessoas, mas foram chegando estudantes e fechamos a rua, em frente a justiça federal. Os atingidos e desabrigados por Belo Monte começaram a falar suas histórias e o quanto estão sofrendo com isso. Estão lutando pelos direito  deles, a frase que marcou foi a frase ‘’lutar não é crime. é um direito’’! Todos atentos e comovidos com a história dos trabalhadores, ribeirinhos,agricultores,enfim todos os que serão e estão sendo afetados por Belo Monte. A participação de jovens foi muito surpreendente. Os seres humanos tem direito a saúde e estudo de qualidade. A Norte Energia é um monstro, o ser humano é capaz de matar a si e a muitos por ganancia, perdi minha infância… a Norte Energia tirou minha infância.”

Karoline e sua família foram obrigados a deixar sua terra em Fevereiro de 2012, sobrevivem atualmente de favores e até hoje não receberam nenhuma indenização.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Story of Stuff (A História das Coisas)

Um dos melhores vídeos que já assisti!

Neste vídeo, a americana Annie Leonard consegue "traduzir" toda a cadeia de produção dos bens de consumo e nos mostrar como o capitalismo está envolvido com os malefícios ao meio ambiente e às sociedades.

Assitam! É muito esclarecedor!



Para saber mais (em inglês):


Livro Bezerro Escritor



Vivemos em um ambiente de alimentação tóxica onde as crianças são bombardeadas para consumir carne, milkshake e todo tipo de junk food. A cultura vegetariana é muitas vezes criticada pela grande mídia e o entretenimento padrão para crianças não dá qualquer suporte para combater o especismo.
Este livro infantil foi pensado principalmente para pais ou mães vegetarianos, veganos ou simpatizantes. Ele trata do leite pelo ponto de vista de um bezerro desmamado. O consumo de leite de vacas por humanos faz parte da cultura mundial, mas sua industrialização transformou o processo em tortura para milhões de vacas e filhotes, além de que, cada nova pesquisa traz os malefícios do consumo de leite de vaca por humanos. O livro é infantil e não abordará todas as questões do leite, mas conterá um pós-fácil com referências para quem desejar se aprofundar no assunto.
O Bezerro Escritor foi criado em rimas populares e contém ilustrações do autor, Igor Colares. Abra o coração e entenda o ponto de vista de um filhote de vaca.



Complexo Tapajós: mais um tributo à voracidade do modelo desenvolvimentista

Corredeiras do Rio Tapajós que serão alagadas na construção da barragem da Hidrelétrica de São Luiz do Tapajós no Parque Nacional da Amazônia - PA / Foto: Cintia Guido

Na surdina o governo vai levando adiante o plano de construir o Complexo hidrelétrico na bacia do Tapajós – o maior mosaico de biodiversidade do planeta. Embora menos comentado e debatido, o projeto é considerado ainda mais devastador do que Belo Monte.

Para viabilizar o projeto, o governo publicou em janeiro uma medida provisória – convertida em lei em junho –, reduzindo as unidades de conservação nas áreas que serão atingidas pelas obras.

O retalhamento da principal área de unidade de conservação da floresta amazônica brasileira foi definido como uma “questão lógica”: “Há uma decisão estratégica de desenvolvimento do país e o potencial para gerar a energia capaz de atender essa demanda está localizado em áreas de proteção integral. Para permitir a realização dos estudos, a área tinha que ser desafetada. É uma questão lógica”, disse Roberto Ricardo Vizentin presidente do Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio), paradoxalmente o órgão responsável pela vigilância dos parques e unidades nacionais de preservação.

Dessa forma se tornou possível o “iminente sacrifício de 140.000 ha de Floresta Amazônica no altar do PAC” diz o Movimento Tapajós Livre. O Complexo Tapajós é mais um tributo à voracidade e insaciabilidade do modelo desenvolvimentista.

Não basta Belo Monte no Rio Xingu, Jirau e Santo Antônio no Madeira, Teles Pires (suspensa no momento), Araguaia ou ainda as dezenas de hidrelétricas em construção pelo país. Agora, o modelo desenvolvimentista quer mais, quer Tapajós – um santuário da biodiversidade não apenas brasileira, mas, planetária.